Em pleno século 21, os atos de discriminação ainda permeiam a vivência de boa parte da população brasileira. Não raras vezes, deparamos com situações em que é dado tratamento inferiorizado a uma pessoa em razão da sua pertença a uma determinada raça, sexo, nacionalidade, origem étnica, orientação sexual ou outro fator.
Quando essa prática ocorre dentro do ambiente de trabalho, para além das políticas que devem ser incorporadas por empresas a fim de evitar ao máximo situação análoga, o Ministério Público do Trabalho possui papel imprescindível nesse combate.
A Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) define em seu artigo 1º discriminação como "toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidade ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão” ou, ainda, como “qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão".
Referida Convenção foi ratificada pelo Brasil em 26 de novembro de 1965 e traz medidas para eliminar a discriminação em matéria de emprego e ocupação, através do incentivo a leis e programas de educação sobre o tema e à colaboração com empregadores e organismos.
A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), por sua vez, proíbe diferenças salariais por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil — vide artigo 7º, inciso XXX.
Em complemento, a Lei nº 9.029/1995 veda expressamente a adoção de qualquer prática discriminatória para efeito de acesso à relação de emprego ou sua manutenção, seja por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil ou idade (vide artigo 1º) bem como garante àquele que sofreu rompimento da relação de emprego por ato discriminatório o direito à reparação pelo dano moral e a opção entre a reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, e a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, ambas corrigidas monetariamente e acrescidas dos juros legais (vide artigo 4º, incisos I e II).
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), por sua vez, culmina multa por discriminação em razão do sexo ou etnia, ao passo que garante a isonomia salarial (vide artigo 461, §6º).
Denota-se, portanto, ser vasta a previsão legal quanto a proteção contra atos discriminatórios no ambiente no trabalho. Todavia, tais condutas podem vir a ocorrer e, nessa hipótese, mesmo que garantido o acionamento do Poder Judiciário pelo lesionado, o próprio Ministério Público do Trabalho (MPT) tem a faculdade de levar as ofensas ao crivo do Judiciário.
Dentre as prerrogativas do Ministério Público do Trabalho, está o resguardo dos direitos dos atuais e dos futuros trabalhadores, como forma de tutela de interesses coletivos, indivisíveis e homogêneos indisponíveis e, com isso, passível de atuação do Órgão no combate às infrações.
A CRFB, em seu artigo 127, determina ao Ministério Público do Trabalho "a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis", bem como em seu artigo 129, inciso III, incluiu os interesses difusos e coletivos na relação daqueles a serem defendidos através de ação civil pública.
A Lei Complementar nº 75/1993, especificamente no artigo 6°, inciso VII, dispõe ser da competência do Ministério Público da União "outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos".
Nessa mesma linha, a Lei nº 8.625/1993, que instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, menciona, expressamente, na alínea a do inciso IV do artigo 25, os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Já o Código de Defesa do Consumidor admitiu, expressamente, a defesa de interesses individuais e homogêneos por meio de ação coletiva.
Com base nesse conjunto normativo, o Ministério Público do Trabalho tem legitimidade ativa para propor ação civil pública perante a Justiça do Trabalho, visando a defender os interesses difusos e coletivos e, também, os individuais homogêneos indisponíveis dos trabalhadores.
Nesse diapasão, os atos praticados por empregadores que violem direitos e interesses individuais homogêneos ou difusos são passiveis de vindicação pelo MPT, que poderá requerer tanto a reparação de interesses individuais violados quanto a adequação do comportamento ao ordenamento jurídico, cuja efetividade é de interesse público.
Tal faculdade se mostra relevante e demonstra-se o porquê. Muitas vezes o simples fato de o trabalhador poder ingressar em juízo requerendo a fixação de indenizações para reparar dano sofrido por discriminação, não constitui — na visão de algumas empresas — como risco a ser provisionado e combatido em sede de regramento interno.
O raciocínio "vamos ver se ajuíza ação" permeia o entendimento de diversos empresários que, com tal sentimento, não se sentem suficientemente motivados para adequar a empresa aos ditames das leis supramencionadas e, mais que isso, aos direitos básicos de qualquer pessoa.
O envolvimento do Ministério Público do Trabalho, por si só, agrega força à necessidade de atenção que o tema demanda. Nenhum empresário deseja ser investigado pelo MPT e, quando aberto inquérito civil, há clara tentativa de adequação à norma — inclusive através da assinatura de Termos de Ajustamento de Condutas.
A participação do Órgão, inclusive, pode ocorrer através de análise de denúncias feitas pela população. É disponibilizado via site um canal de fácil acesso de comunicação com o MPT na defesa de direitos coletivos dos trabalhadores.
Dessa forma, o que se denota é que — de fato — o Ministério Público do Trabalho desempenha papel imprescindível no combate aos atos de discriminação em ambientes de trabalho, ao desempenhar um trabalho necessário e essencial à população, que sempre poderá recorrer ao Órgão quando verificada usurpação de direitos.
Bibliografia
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Carolinne Wyllie Queiroz - Advogada trabalhista do escritório Gabriel Quintanilha Advogados. Pós-graduanda em Direito Digital e Proteção de Dados pelo IBMR/RJ, Pós-graduada em Direito do Trabalho pela PUC/MG. Pós-graduada em Direito Previdenciário pela PUC/MG. Graduada em Direito pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais – IBMR/RJ.
Fonte: Revista Consultor Jurídico
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