Estudo conclui que reforma deve elevar carga tributária, mas reconhece avanços na distribuição de renda. Ex-secretário da Receita chama proposta de 'eleitoreira'.
Um estudo do Observatório de Política Fiscal do Ibre/FGV estima que a restrição ao uso da declaração simplificada do Imposto de Renda aumentará a tributação de cerca de 2 milhões de contribuintes.
Em 2019, aponta o estudo, 17,5 milhões de contribuintes declaram imposto de renda pelo formulário simplificado e o imposto devido totalizou R$ 60 bilhões.
A ideia de limitar o uso da declaração simplificada, que embute desconto automático de 20% (até R$ 16.754,34) sem necessidade de comprovar gastos dedutíveis, faz parte do projeto de lei entregue pelo governo à Câmara com a proposta do governo para o que seria uma segunda fase da reforma tributária.
Se a proposta da equipe do ministro Paulo Guedes for aprovada pelo Congresso, a declaração simplificada só poderia ser usada por contribuintes com renda anual de até R$ 40 mil, o que equivale a uma renda aproximada de três salários mínimos mensais. Quem ganha mais que isso perde a chance de optar por este desconto automático.
Na primeira versão do estudo do Ibre/FGV, publicada na terça-feira, os pesquisadores Manoel Pires e Fábio Goto haviam estimado que a alteração poderia afetar 6,8 milhões de contribuintes.
O levantamento considerou então que todos os contribuintes com renda anual até R$ 40 mil já optam pela declaração simplificada.
No entanto, nesta quarta-feira, eles fizeram uma correção a partir de sugestão do economista Sérgio Gobetti para que, em vez de renda anual de R$ 40 mil, fosse utilizada uma linha de corte mais elevada, em torno de R$ 65 mil, para considerar mais possibilidades de deduções que atenuam a base de cálculo.
"Com essa faixa e considerando cenários alternativos ele conclui, junto com o economista Rodrigo Orair, que a mudança deve atingir 2 milhões de contribuintes", afirmou o texto corrigido.
O estudo afirma que os resultados podem ser afetados por mudanças no comportamento do contribuinte e defende que a Receita divulgue números próprios.
"Nesse sentido, é importante que a Receita divulgue uma estimativa de impacto porque nossas estimativas estão superestimadas".
Segundo o estudo da FGV, essa mudança no formulário simplificado ajudaria a atenuar o impacto fiscal de outra proposta do que vem sendo chamado de segunda fase da reforma tributária: a correção da tabela do Imposto de Renda.
Mais de 5 milhões ficarão isentos
Nos planos do governo está elevar de R$ 1.903,98 para R$ 2.500 o limite de isenção. A estimativa é que o número de contribuintes isentos suba de 10,7 milhões para 16,3 milhões.
Os pesquisadores também avaliariam a proposta do governo de reduzir, de forma escalonada, a alíquota do Imposto de Renda para as empresas, dos atuais 15% para 10% até 2023.
O trabalho ressalta que a medida faz sentido já que o Brasil tem uma das alíquotas mais altas no mundo e teria impacto fiscal estimado em R$ 25,9 bilhões.
Para compensar a perda de arrecadação, o governo propõe cobrar imposto de dividendos recebidos por acionistas de empresas (atualmente isentos), com alíquota de 20%.
A conclusão dos pesquisadores da FGV é a de que a proposta incentivará empresas a reduzirem a distribuição de lucros, com impacto sobre investimentos.
No conjunto, eles avaliam que a reforma proposta vai aumentar a carga tributária. “A depender do impacto da nova tributação sobre lucros e dividendos, é provável que haja aumento da carga tributária”, conclui o estudo.
No entanto, o trabalho registra que, “de maneira geral, as propostas possuem um impacto positivo na distribuição de renda”, elevando a tributação entre as classes de renda mais alta.
‘Proposta imediatista e eleitoreira’, critica Cintra
Marcos Cintra, professor da FGV que foi o primeiro secretário da Receita Federal do governo Bolsonaro, critica a proposta de retomar a tributação de dividendos no Brasil. Segundo ele, as compensações ao aumento da faixa de isenção do IR anulam os ganhos para as famílias:
— É proposta imediatista, eleitoreira e populista. Alguém que ganha na faixa dos R$ 3,5 mil, com a limitação do desconto simplificado a R$ 40 mil anuais, vai pagar mais imposto. É classe média baixa subsidiando a classe pobre.
Ele diz que alguns pontos foram incluídos para permitir uma negociação, como o percentual de 20% incidir sobre dividendos, que deve cair para 15% no Congresso.
Cintra vê como pontos positivos, além da correção da tabela, a unificação da tarifa para o setor financeiro, a retirada de benefícios do IR para alguns fundos e o fim de normas obsoletas.
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